Localizado à saída da Calçada de Carriche, num pequeno largo junto à estrada que leva a Odivelas, encontra-se o padrão do Senhor Roubado, monumento datado de 1744.
A sua construção deveu-se a um roubo efectuado na igreja de Odivelas, em 1671, alegadamente pelo jovem António Ferreira, que aí roubou do altar-mor e de outros altares desta igreja, as contas do rosário de N. Sra. do Rosário, as vestes do Menino Jesus e da Senhora do Egipto, os Vasos Sagrados, entre outros, escondendo-os numa mata de caniços onde está hoje o Senhor Roubado.
Numa época de extrema religiosidade, a dimensão deste caso foi tal que, quando chegada a notícia à capital, foram enviadas missivas a todo o reino, e afixados éditos prometendo recompensa em dinheiro e um emprego na justiça ou na fazenda, a quem denunciasse o autor do crime; a corte pôs luto e foram feitas procissões nas ruas.
Encontrados os objectos escondidos, e mais tarde confessado o roubo sacrílego por António Ferreira, após ter sido apanhado a roubar galinhas, por uma criada do Mosteiro de Odivelas, e tendo-lhe sido encontrada na bolsa a cruz de prata do remate do vaso dourado do Santíssimo, foi julgado em Lisboa e condenado a ser "arrastado e levado à praça do Rocio desta cidade, aonde lhe serão decepadas ambas as mãos e queimadas à sua vista, e depois seu corpo será queimado ...".
No local, numa oliveira, foi colocado um padrão de cruz, em madeira, que, mais tarde, o religioso António dos Santos transformou no padrão do Senhor Roubado, construído com pedra cedida pela pedreira da Paradela, e que o próprio realizou, pagando o restante trabalho com esmolas.
Era um local para os fiéis se encomendarem a Deus e pedirem perdão pelos seus pecados.
O Monumento ao Senhor Roubado é composto por um recinto, em forma de trapézio isósceles, com uma superfície de dez metros de comprido por oito de largura, e o arranjo arquitectónico apresenta-se a modo de templo descoberto. É uma espécie de altar ou oratório, constituído por um alpendre assente em quatro colunas toscanas e fechado por parede na parte posterior. No interior encontra-se o padrão que rememora o roubo sacrílego. Existe ainda no recinto um púlpito, conferindo-lhe a feição de lugar consagrado ao culto divino. Na face ocidental, um paredão inteiramente forrado de azulejos monocromáticos; nas partes inferior e superior, doze quadros ou painéis historiados, cada um composto por 72 azulejos, com legenda explicativa sobre as cenas do roubo.
Localização:
Rua Pedro Álvares Cabral/Rua do Sr. Roubado, Odivelas
O Monumento
O acontecimento foi caindo no esquecimento, no entanto no local onde António Ferreira escondera o produto do furto fora colocada uma cruz de madeira, onde mais tarde será erguido o Senhor Roubado, tendo o próprio monumento nele uma inscrição explicativa da sua origem:
“Aqui ocultou a ingratidão
Do maior roubo a insolência
Mas levou a clemência
A memória do perdão.
Este piedoso padrão
Com eterna dor se leia
Aqui um atroz ladrão
Às duas da noite e meia
Os céus enterrou no chão.
Caso de Odivelas – Ano de 1671
Este padrão dez-se no ano de 1744″
Sr. Roubado – Painel de Azulejos
Do lado ocidental do Monumento ao Senhor Roubado, eleva-se um paredão tendo ao longo da parte superior um beiral de telha. a meio da parede há uma porta fingida, ou simulada e que é típica do simbolismo religioso como designativa do Portal do Céu, pelo que dois anjos a guardam, um em cada lado. No cimo desta parte, está gravada a inscrição:
Louvado seja o Santíssimo Sacramento e a trindade da terra- Jesus-Maria-José. Feita pelas almas, Padre nosso, Avé-Maria.
E, no enxaimel: Esta foi feita com esmolas dos fiéis. 1744
De cada lado da porta perfilam 12 painéis de azulejo não assinados, no entanto julga-se serem datados de 1744 ou reinado de D. João V pela técnica empregue.
1º Painel: António Ferreira estava a jogar e, vendo passar o Sacristão da freguesia de Odivelas, decidiu segui-lo. Meteu-se na igreja, onde ficou oculto, sem ser notado pelo Sacristão.
2º Painel: A seguir despiu as imagens dos santos, arrombou a porta do Sacrário e furtou os vasos sagrados. Nesse instante, talvez por temor, desmaiou.
3º Painel: Sentindo gente aproximar-se, enrolou as vestimentas das imagens e dirigiu-se a Lisboa, pelo caminho do sítio dos Caniços, onde, numa vinha, enterrou os vasos roubados.
4º Painel: Continuando para Lisboa, foi a casa de uma mulher velha, onde, numa arca, escondeu os paramentos dos santos.
5º Painel: sabedor do caso, el-rei D. Pedro II mandou efectuar a devassa ao furto de Odivelas. Entre os ouvidos conta-se António Ferreira. Não se dá por autor,e chega a afirmar que à pessoa que tal acto consumou deveriam ser cortadas as mãos
6º Painel: Entretanto, o mesmo António Ferreira é apanhado a pilhar galinhas na cerca do Convento de S. Dinis, às freiras. Apanhado em flagrante, viu-se que trazia ao peito uma cruz que pertencia aos vasos roubados.
7º Painel: Detido, vem a confessar o roubo das vestimentas e revela onde as tinha escondido.
8ºPainel: Confessa, por fim, que tinha sido o autor do roubo dos vasos, e informa do local onde os escondera.
9º Painel: Vem o Pároco de Odivelas, com o Paiol, e muito povo, e leva o Santíssimo para o Paroquial.
10º Painel: O réu é conduzido a Lisboa, onde lhe é dada a sentença do corte das mãos. A sentença foi proferida em Alfama, pois do azulejo consta a Casa dos Bicos
11º Painel: É levado ao suplicio do corte das mãos.
12º Painel: Condenado, como herege, ao garrote e à fogueira.
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