segunda-feira, 31 de dezembro de 2001

Encontro de Taizé em Budapeste (2001/2002)

A hospitalidade, um rosto de Deus

Abrir as suas portas a desconhecidos nunca é uma coisa fácil. Graças a meses de trabalho, centenas e centenas de reuniões de preparação, foi possível preparar um acolhimento não só em Budapeste, mas também em numerosas localidades dos arredores.
No dia 28 de Dezembro de manhã, milhares de famílias húngaras estavam impacientes por conhecerem os jovens que iam acolher durante cinco dias. «Irão conseguir chegar? Ficarão retidos pelas tempestades de neve que caem sobre a Europa central? As formalidades nas fronteiras atrasarão muito a sua chegada? Como ultrapassar a barreira das línguas?» A estes medos acrescentava-se um contexto internacional nada tranquilizador.
Graças a meses de trabalho, centenas e centenas de reuniões de preparação, foi possível preparar um acolhimento em cento e oitenta paróquias, de todas as confissões. Algumas eram a uma hora de Budapeste, junto da fronteira eslovaca. Foram disponibilizadas muitas escolas. E, graças a pedidos feitos através da rádio e da televisão húngara, também se encontraram milhares de lugares em famílias que não frequentam habitualmente as igrejas.
De toda a Europa, três mil jovens chegados logo a 26 de Dezembro repartiram entre si o trabalho de acolhimento do dia 28. Uma reportagem de uma televisão francesa pôs em relevo o sentido de serviço, espantosamente vivo nestes jovens. Foi muito graças a eles que foi possível acolher e rezar com os 70.000 participantes no encontro.
Enquanto a maioria dos jovens de outros povos foi primeiro recebida em escolas da cidade, os polacos chegaram ao Parque das Exposições antes de serem orientados para as paróquias de acolhimento. Foram os mais numerosos. Muita gente pergunta que explicação há para a presença destes milhares de jovens polacos ano após ano. Obviamente que não se trata de algo superficial: durante todo o Outono, duzentos pontos de preparação na Polónia serviram não só para difundir as informações necessárias ao encontro e à viagem, mas também para organizar orações em comum e tempos de reflexão. «Em Wroclaw, em Dezembro, antes da minha partida para Budapeste, havia todos os dias uma oração com os cânticos de Taizé numa igreja da cidade» dirá Alicia, estudante de ciências políticas.
Mas havia também 4.000 romenos e outros tantos italianos. Os ucranianos, germanófonos, croatas e franceses vinham logo a seguir. Nunca tinham sido tantos a vir dos Balcãs, que aumentaram assim consideravelmente a presença tão apreciada dos ortodoxos. Para chegar a Budapeste, alguns dos 300 portugueses partiram no dia de Natal.

Dúvidas e surpresas

As relações muitas vezes tensas entre a Roménia e a Hungria deixavam surgir uma dúvida sobre o acolhimento aos romenos. Dúvida que se sentia dos dois lados da fronteira. Seria finalmente uma das mais alegres surpresas desta «peregrinação de confiança». Para os romenos: «Não pensávamos ser acolhidos assim na Hungria.» Para os húngaros: «Não sabíamos que nos poderíamos ligar desta forma a romenos.» Uma das famílias de acolhimento já tinha feito essa experiência em 1991, aquando do primeiro encontro de Budapeste. Na altura, tinham escrito na sua ficha de acolhimento: «Acolheremos quatro pessoas, mas não queremos romenos, por favor.» Apresentaram-se à sua porta quatro romenos. Para dizer o que foram esses dias vividos em conjunto, basta olhar a sua ficha de acolhimento deste ano: «Quatro pessoas. Romenos, por favor.»
Uma jovem arquitecta húngara escreve: «Tinha previsto acolher quatro pessoas no meu apartamento. Acabei por acolher seis, e mais quatro para a refeição do dia 1 de Janeiro. A confiança que lhes demonstrei foi-me paga cem vezes. É espantoso como, no fim, tudo fica no lugar. Muitos outros farão a mesma apreciação. Não vivia desesperada antes disto, mas estes dias passados em conjunto certamente que reforçaram em mim uma esperança e talvez uma capacidade de olhar o futuro com confiança. E sei que isto se deve à bondade e simplicidade que encontrei.»
Há numerosos testemunhos que vão no mesmo sentido e fazem eco do que os primeiros cristãos já sabiam: oferecer hospitalidade é, como para os discípulos de Emaús, descobrir a face de Deus. A palavra «milagre» está em muitas bocas. «Somos compreendidos sem falar a mesma língua.» Com humor, um jovem de Budapeste diz: «Em Babel, Deus baralhou as línguas porque os homens trabalhavam contra ele, em Budapeste, era o nosso desejo comum de viver o Evangelho que nos reunia e compreendíamo-nos.»

«No princípio, o caos...»

O mais antigo semanário católico da Hungria publicou este testemunho de um adulto de uma paróquia que acolheu 700 jovens: «No princípio estava tudo um pouco caótico. No dia 28 de Dezembro chegaram quase todos ao mesmo tempo. Foi preciso tempo para os acolher e era um pouco difícil. A nossa pequena igreja e a nossa casa paroquial pareciam uma sala de espera de uma estação de caminho de ferro num filme de guerra! Os responsáveis trabalharam bem e os nossos hóspedes mereciam um prémio pela sua paciência e compreensão. Milhares de pessoas na nossa capital descobriram que oferecer o seu tempo, deixar provisoriamente a paz e a calma do seu lar, não é só um acto bondade, é também fazer a experiência de como é bom fazer isso. Em cada paróquia, houve famílias que, durante alguns dias, abriram a sua casa a estrangeiros e compreenderam que somos ricos. Estamos ligados uns aos outros, mais do que aquilo que pensamos. No dia 1 de Janeiro, a nossa igreja estava tão cheia que os padres tiveram dificuldade em chegar ao altar. Estes dias transmitiam uma mensagem importante: a fé cristã é universal: húngaros, romenos, italianos, japoneses, lituanianos, franceses, somos membros de uma mesma família. Descobrimos como cada um tem tesouros únicos, mas também que esses tesouros podem ser partilhados. E que o acto de os partilhar não os compromete mas antes os aumenta. Ficam então ainda mais preciosos e mais nossos.»