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11 de novembro de 2024

O Mosaico do Jardim da Estrela

No Jardim da Estrela, o tempo parecia andar muito devagar. As crianças de vários, tamanhos, cores e defeitos corriam atrás de bolas coloridas enquanto os idosos, sob a sombra das árvores, disputavam partidas de dominó com a paciência de quem sabe aproveitar a vida. Mas o que tornava aquele espaço verdadeiramente especial não era a tranquilidade nem os risos infantis, mas como a diversidade se entrelaçava em cada canto, como os ramos de uma árvore que crescem por todos os lados, mas pertencem ao mesmo tronco.

A Clara, uma menina cega de olhos curiosos, tornara-se a guia sensorial de Sofia, que usava uma cadeira de rodas e adorava explorar o mundo com os sentidos que podia usar. Naquele dia, Clara segurava uma flor entre os dedos delicados e dizia com convicção: “Esta é lavanda. Cheira como se o mundo parasse por um segundo, não achas?” Sofia aspirava profundamente e respondia com um sorriso: “Sim, mas não é só o cheiro. Ouve como o vento parece dançar entre os ramos. É como uma música!” Ambas de 12 anos e sentiam a luz das flores a irradiarem nas mãos. E na falta dum sentido sensorial, apuravam-se os outros.

O Miguel, um rapaz que comunicava por linguagem gestual, estava num debate acalorado com o Lucas, um menino com síndrome de Down que adorava as histórias fantásticas. As mãos de Miguel moviam-se rapidamente e Lucas, mesmo sem entender todos os sinais, replicava com entusiasmo: “E depois o dragão voou tão alto que desapareceu nas nuvens!” Ana, uma jovem que aprendera linguagem gestual, estava ali, para unir os dois mundos, traduzia com uma alegria que contagiava.

Nos sábados, o bairro reuniu-se para criar algo monumental. Um mosaico que representasse a praça e as suas pessoas. As peças de cerâmica quebradas espalhavam-se pelo chão, cada uma com uma cor ou textura distinta. Sara, uma jovem com dificuldades motoras, mas com um talento único para a pintura, orientava quem não sabia por onde começar. “A arte é sobre o que sentimos. Não há erros, só emoção.”, dizia. Hugo, que usava os aparelhos auditivos, liderava com um carisma que fazia com que, os mais tímidos participassem.

Quando o mosaico ficou pronto, era mais do que uma obra de arte. Era um reflexo de vidas interligadas, de histórias compartilhadas. Clara passou os dedos pelas peças ásperas e murmurou: “Sinto cada um de nós aqui. Como se estivéssemos juntos, mesmo quando não estamos.”

Naquele dia, ninguém falou em diferenças. Elas não eram barreiras, eram pontes. O Jardim da Estrela tornou-se um símbolo de união, onde todos aprenderam que a verdadeira força de uma comunidade está na capacidade de ouvir, acolher e criar juntos.

Somos todos iguais e diferentes ao menos tempo. 

(Tema do mês de Novembro: Inclusão e Diversidade da Escrita)

1 comentário:

Anónimo disse...

Se fossemos todos iguais, não tínhamos experiências e histórias de vidas vividas, a visão da própria pessoa, as opiniões da vida pelo que já viveram.

Podia contar tantas vidas que conheço que aprenderam a viver com o que tem e com isso aprendem a ter uma mente aberta para a diversidade do mundo.
— Meninas e meninos que nasceram com síndrome, que afeta o desenvolvimento dos ossos e tecidos faciais. Cirurgias, Hospitais e sobrevivência. Nem eles, nem os pais têm culpa.
— Duas meninas gémeas que nasceram normais e com tempo e idade, os ossos atrofiaram. Perderam mobilidade nos braços e pernas. E vivem com uma cadeira de rodas. São lutadoras, sobreviventes e muito dadas às pessoas.
— Um rapaz de uma família negra, custou muito a nascer. Ótimo rapaz, inteligente, conversador, filho único. Aos 15 anos, falece graças a uma brincadeira numa colónia de férias.
— Uma prima que em lua de mel, foi andar de bicicleta. Com uma pedra e uma ribanceira, ficou tetraplégica. Foram 40 e muitos anos de cadeira de rodas. Marido arquitecto, sem filhos, construiu uma moradia para pessoas de cadeiras de rodas. E agora, uma amiga, na cadeira de rodas com um acidente aos 20 anos.
— Um rapaz que aos 4 anos, teve meningite. Ficou cego, o que deixou muito revoltado. Perdeu os dedos, á conta de ter vista e agora não tem, de apalpar tudo.
— Rapazes que viviam como homens, mas sentiam doutra maneira. Tal como pessoas que eram canhotos. Devido a famílias com estereótipos, que proibiam certas situações.
— Pessoas que deixam de falar com pessoas por terem deficiências ou por cor de pele diferente, ou por ter outra língua.
E há muitos mais pelo mundo à fora.