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4 de agosto de 2017

Lagoa de Óbidos - um paraíso em vias de desaparecimento


A Lagoa de Óbidos é uma zona húmida de particular valor económico e ambiental, já referida nos documentos das cortes de Évora de 1460, e que se encontra sujeita a uma grande diversidade de ameaças. Conheça a Lagoa e os seus problemas.

A Lagoa de Óbidos é uma Zona Húmida, o que se define com alguma dificuldade, visto que as zonas húmidas ocupam o espaço de transição entre meios permanentemente húmidos e geralmente secos, possuindo características de ambos, sem no entanto poderem ser rotuladas sem ambiguidade, de terrestres ou aquáticas, visto que a presença prolongada de água modifica os solos, organismos microscópicos neles contidos e comunidades de plantas e animais.

Iremos seguidamente fazer uma pequena viagem por esta Lagoa, que é a maior de Portugal Continental e apresenta inúmeras características de interesse, tanto científico como lúdico, cultural, económico e social.

A Lagoa de Óbidos tem desempenhado ao longo dos séculos um importante papel económico e social. São dois os Concelhos de que esta área depende, Caldas da Rainha e Óbidos, mas a bacia em si, enquadra-se num contexto mais vasto, constituído pelos 16 concelhos do Oeste, de Torres Vedras a Alcobaça e Nazaré. Já em 1460, um documento das cortes de Évora, descreve a obrigação dos habitantes das povoações próximas, em participar nos trabalhos de abertura da Lagoa de Óbidos para assegurar a sua drenagem. Em 1642, D. João IV, decreta por alvará, que ninguém abra a Lagoa sem autorização prévia da Câmara, alegando que aberturas fora do tempo provocam danos para a saúde pública. Em 1946, foram descritas, pela primeira vez em Portugal, intoxicações alimentares graves, ocasionadas pela ingestão de bivalves provenientes da Lagoa de Óbidos e depois disso, têm surgido ciclicamente notícias sobre a proibição da apanha de bivalves, devido à existência de marés vermelhas - a produção de biotoxinas por algumas espécies fito-planctónicas, que se acumulam ao longo da cadeia alimentar com especial incidência nos bivalves, leva à interdição da sua captura e comercialização todos os anos.
Durante as duas últimas décadas, a Lagoa de Óbidos tem vindo a sofrer pressões que há 50 anos eram difíceis de prever. O crescimento populacional na área da bacia e o aumento significativo do número de visitantes, levam a que esta região seja encarada por muitos como apenas mais uma zona de praia. No entanto, para centenas de mariscadores e pescadores, a Lagoa de Óbidos representa o meio de sobrevivência e a faina, sobretudo conquícola, tem vindo a degradar-se todos os anos. Com a construção de barragens ao longo dos afluentes e o excesso de poluição transportada para a Lagoa, tem-se vindo a verificar nos últimos anos uma diminuição dos caudais de água doce, face aos de água salgada, com a consequente diminuição ou desaparecimento de certas espécies. O rendimento bruto global, proveniente da pesca e da apanha de bivalves está estimado como sendo superior a meio milhão de contos por ano, sendo evidente a dependência económica das populações dos recursos directamente provenientes da Lagoa, especialmente no Concelho de Óbidos, sendo a zona de Caldas da Rainha mais industrializada e portanto menos dependente da agricultura e pescas.

Também a recolha e tratamento de resíduos sólidos tem constituídos um dos mais graves problemas da região, com consequências gravosas para a Lagoa. A estrutura de povoamento de várias parcelas de território caracteriza-se por uma acentuada dispersão por lugares de dimensões reduzidas, o que torna difícil mas não impossível, a implementação de medidas integradas de saneamento básico em certas áreas. A suinicultura é outro factor de agravamento das condições da Lagoa, visto que no Oeste há cerca de 5 suínos por hectare; mas estes encontram-se maioritariamente em pequenas suiniculturas familiares com não mais de 20 animais, o que torna a actividade não só pouco competitiva, como também extremamente poluente e difícil de controlar. As principais actividades industriais da bacia hidrográfica da Lagoa são: agro-pecuárias, adegas, destilarias e matadouros, existindo ainda fábricas de produção de cimento, de artigos cerâmicos, sabões e produtos cosméticos e ainda uma pedreira, responsável por grande quantidade de materiais em suspensão. As actividades responsáveis por maior degradação ambiental são as agro-pecuárias e as conservas de carne.

A Lagoa de Óbidos é um sistema lagunar de reconhecida importância ecológica. Devido ao constante afluxo de nutrientes e matéria orgânica de origem continental, os sistemas lagunares contam-se, a par dos estuários e deltas, como dos ecossistemas mais produtivos do planeta e a Lagoa de Óbidos não foge a esta regra, apresentando uma produtividade primária significativa.
A Lagoa de Óbidos não é uma das zonas húmidas de maior relevância a nível nacional, mas comporta um elenco florístico e faunístico que importa conservar e valorizar. A macrofauna bentónica inclui mais de 100 espécies inventariadas que, além do valor conservacionista, assumem também relevância económica pela exploração de bancos de bivalves. Quanto à ictiofauna, esta região lagunar tem um papel fundamental no abastecimento dos stocks continentais através da função de viveiro, estando referidas 52 espécies de peixes, das quais 30 com importância económica. Para além da função de viveiro existem várias espécies residentes, o que atribui à Lagoa importância económica como pesqueiro. A protecção e valorização das comunidades ictiofaunísticas, prende-se não só com a regulação das actividades piscatórias mas também com a protecção e recuperação das zonas de vasa e vegetação ribeirinha, dada a relação próxima entre aquelas e as características geomorfológicas das margens e vegetação ripária. No que concerne à avifauna, a Lagoa de Óbidos não é uma das zonas húmidas mais importantes do País, mas mesmo assim integra 5 espécies com estatuto de conservação delicado, de acordo com o Livro Vermelho dos Vertebrados de Portugal, e várias outras espécies não ameaçadas, mas em regressão noutras áreas da Europa. Em relação a outros grupos de vertebrados terrestres, é de referir a existência da Lontra (Lutra lutra) e de algumas espécies endémicas de herpetofauna.

De toda a área da Lagoa, o Braço da Barrosa é sem dúvida o local de maior importância do ponto de vista ecológico, visto que é importante para vários grupos biológicos distintos, possui uma das poucas manchas de carrascal ainda existentes na Lagoa, assim como algumas zonas de vasa com vegetação relativamente bem conservada, o que define boas condições para a avifauna e tem ainda importância para a ictiofauna, proporcionando condições satisfatórias para a função de viveiro.
Numa apreciação global e de acordo com a avaliação feita pelo ICN e outros autores, a Lagoa de Óbidos não apresenta o grau de importância de outras zonas húmidas, como a Ria de Aveiro e a Ria Formosa, mas tem uma diversidade específica e um elenco florístico e faunístico, que justificam a sua conservação e recuperação ambiental.

No que se refere à geologia da região esta é marcada pela morfosedimentogénese que modela a Lagoa e sua bacia de drenagem. A folha da carta geológica de Portugal que abrange a área em estudo é a 26-D de Caldas da Rainha, na escala 1:50000; existem na zona drenada para a Lagoa formações diversas, de idades Jurássicas a Quaternárias, pertencentes na sua grande maioria ao Vale Tifónico de Caldas da Rainha. A zona drenante para a Lagoa é formada pelas seguintes litologias: Margas, argilas salíferas, margas gipsíferas e calcários margosos e dolomíticos do "Complexo da Dagorda". São formações com comportamento diapírico que funcionam por vezes como barreira hidráulica para as águas infiltradas e originam termalismo - caso das nascentes termais de Caldas da Rainha e de outras nascentes mais ou menos quentes e mais ou menos sulfurosas existentes na região (Salir do Porto, Serra do Bouro, Águas Santas, Óbidos, etc.). Calcários e margas de vários tipos. Distinguem-se as "Camadas de Montejunto" e as "Camadas de Alcobaça" , ambas essencialmente calcárias e que estão relacionadas com a recarga das nascentes termais, mais especificamente às Camadas de Montejunto. Surgem ainda: "Grés superiores com vegetais e dinossáurios", "Grés de Torres Vedras", areias e arenitos, formações arenosas constituídas por antigas praias e terraços, tufos calcários, dunas e rochas eruptivas como o grande filão das Gaeiras, com cerca de 6 km de extensão.

Quanto à geomorfologia desta Lagoa e sua bacia, a área total da bacia hidrográfica dos vários cursos de água que drenam para a Lagoa de Óbidos, ronda os 440 km2 e pode ser subdividida em várias sub-bacias. A Lagoa, cuja área ronda os 7 km2, tem um comprimento máximo de 4,5 km e uma largura máxima de 1800 m, prolongando-se por dois braços: do Bom Sucesso e da Barrosa. Das várias linhas de água que nela confluem destacam-se o rio Borraça, o rio da Cal, o rio Arnóia e o rio Real, tendo os dois últimos respectivamente 9,31 e 33 km de extensão. A sub-bacia do rio Arnóia tem uma área de 125 km2 e a do rio Real, 250 km2. A maior parte da bacia hidrográfica da Lagoa de Óbidos tem cotas inferiores a 200 m, mas nas cabeceiras a SSE estas ultrapassam os 600 m. A escorrência faz-se essencialmente no sentido SE=>NW (rios Arnóia e Real) e a rede de drenagem é preferencialmente sub-paralela. A Lagoa de Óbidos ocupa uma depressão pouco profunda separada do ambiente marinho por uma barreira natural constituída por um cordão de dunas litorais. A zona drenante directamente para a Lagoa de Óbidos ou para os seus afluentes, rios Real, Arnóia, Cal e Sujo é constituída por: praticamente todo o concelho de Óbidos, toda a extensão das bacias de drenagem dos Rios Real e Arnoia que vêm dos Concelhos de Rio Maior e Bombarral e, se estendem até aos concelhos da Lourinhã e Torres Vedras, as localidades da Foz do Arelho, Nadadouro e Caldas da Rainha e respectiva envolvente, que inclui o extremo Sul da Serra do Bouro e se prolonga para Norte até Tornada a partir da cidade de Caldas da Rainha e, as localidades da Fanadia, S. Gregório da Fanadia, A dos Francos e Landal e respectiva envolvente. O rio Arnóia entra no concelho das Caldas da Rainha a Sudoeste pelas freguesias do Landal e A dos Francos. O Rio Real atravessa o Concelho de Óbidos, proveniente do Bombarral, com direcção sensivelmente Este-Oeste; o rio da Cal, com menos de 30km, atravessa a cidade de Caldas da Rainha em direcção à Lagoa de Óbidos. O rio Sujo, de muito pequena dimensão (inferior a 6km), desagua no rio da Cal.
Tem importância geológica de destaque a estrutura sedimentar conhecida por “Penedo Furado”, onde se evidenciam estruturas indicativas de paleocorrentes. Este monumento geológico tem vindo a degradar-se de ano para ano, sem que muito se tenha feito para o impedir, para além de algumas visitas ao mesmo, que acabaram por nunca ter sequência efectiva. Existe a possibilidade de estudar alguma forma de tratamento a dar à estrutura que diminua ou atrase a erosão que tem vindo a sofrer, mas por enquanto nada foi feito nesse sentido.

No que se refere à dinâmica sedimentogénica responsável pela morfologia existente na Lagoa de Óbidos e pelas alterações que a mesma sofre constantemente, podem considerar-se 6 sistemas ambientais: litoral, lagunar, lagunar emerso, fluvial, continental e antrópico. Os sistemas fluvial e continental contêm sedimentos maioritariamente arenosos e reflectem a litologia da bacia de drenagem. No sistema litoral encontramos a zona entre marés, as dunas litorais, a ante-praia e antigos canais de comunicação com o mar, todos com predominância de materiais arenosos, transportados pela água e pelo vento. A origem dos materiais mais grosseiros é fluvial e por queda das arribas, enquanto os arenosos são principalmente oceânicos por desmonte de arribas e da plataforma continental, à excepção dos transportados pelo vento que são continentais ou provenientes da praia. As areias oceânicas provêm essencialmente da região a Sul da Nazaré, enquanto as de outras origens provêm do continente através da lagoa, do litoral, das dunas, etc. No sistema lagunar predominam também as areias e estas reflectem um ambiente de fraca intensidade de correntes que determina uma calibração dos materiais com predominância de finos. No sistema antrópico incluem-se essencialmente materiais dragados e obras construídas, existindo áreas que suportam actividades desapropriadas ou incompatíveis com a correcta gestão, como a utilização balnear perto do cais onde coexistem descargas de resíduos, a acumulação de dragados perto da Foz dos Rio Real e da Ponta da Ardonha , a construção de moradias em zonas dunares a Sul e sobre dunas continentais a Norte.

Foi construída recentemente uma estrutura hidráulica, que delimita o canal de escoamento da Lagoa para o mar, a Norte e, pretende imprimir uma velocidade de corrente de escoamento na maré vazante tal, que os materiais que têm vindo a encher o interior da Lagoa, sejam escoados para o mar e este movimento, não seja contrariado pelos materiais que vêm do mar na maré cheia. Na prática o que se tem verificado, é que estas correntes de maior velocidade e grande competência hidráulica, não só carreiam grande quantidade de sedimento do interior da Lagoa para o mar, mas também têm vindo a provocar forte erosão do outro lado, junto à vila do Bom Sucesso, pondo em perigo as estruturas urbanas aí existentes. Por outro lado estes materiais erodidos no Bom Sucesso, acabam por se depositar nas imediações e têm vindo a provocar o assoreamento de certos locais junto à referida vila, onde a água perde capacidade de carga.
A Lagoa de Óbidos é um ambiente efémero, com tendência natural para o assoreamento, visto que sempre se verificou um maior transporte de sedimento do mar e rios para a Lagoa, que desta para o mar. Houve, entre 1917 e 1980, um total de sedimentação de 2692750 m3 e um total de erosão de 250500 m3, acompanhadas de alterações fisiográficas que levaram à diminuição da área por ela ocupada.

A natureza e evolução das lagoas dependem do clima e de certas variáveis como a precipitação e a evaporação, que exercem importante influência na salinidade do meio e no fluxo de contribuições de materiais. Sendo estes fenómenos sazonais, vão introduzir modificações periódicas no sistema, que não devem ser esquecidas. De acordo com Freitas, C., 1989, as condições climáticas vigentes na Lagoa de Óbidos são as seguintes: temperatura média anual do ar a rondar os 15° C, temperaturas mais elevadas em Agosto e Setembro e mais baixas em Janeiro e Fevereiro, maior insolação em Julho e Agosto e menor em Janeiro, época chuvosa nos meses de Novembro a Abril, ventos predominantes de Norte com maior velocidade média do vento nos meses de Dezembro a Fevereiro, evaporação máxima em Janeiro e mínima em Agosto, o que se relaciona possivelmente com o facto de a humidade relativa média do ar ser máxima em Agosto e mínima e Janeiro. O clima da região classifica-se como mesotérmico húmido com estação seca no Verão de acordo com a classificação de Kopen e, mesotérmico sub-húmido de acordo com a classificação de Thornthwaite.

Toda a zona corresponde a uma Área de Potencial Ocorrência de Património Náutico Subaquático e/ou em Várzea, visto que a zona lagunar e terrenos envolventes até à cota de 10m era ainda navegável no século XVII – Várzea da Rainha que chega ao sopé do Castelo de Óbidos - , podendo encerrar vestígios de antigas embarcações e estruturas de acostagem. Existe também um registo (nº 5370) no IPA, com localização exacta não confirmada, de vestígios arqueológicos diversos na zona da Lagoa pertencente ao Concelho de Óbidos.
Os factores de perturbação referidos como mais relevantes são principalmente os seguintes: poluição provocada por esgotos industriais e domésticos e pelos pesticidas trazidos pelas enxurradas através de toda a bacia hidrográfica, forte pressão turística, construção, pisoteio sobre as dunas, queima do caniço, mobilizações profundas do solo para florestação de grandes áreas, possibilidade de drenagem da Poça do Vau para uso agrícola, caça ilegal e abate de espécies protegidas por lei, progressivo assoreamento da zona aberta que tende a fechar a comunicação da Lagoa com o mar.

A Lagoa de Óbidos foi classificada como um Biótopo CORINE (C21100067) com 2600 ha, sendo este apenas um inventário legal; inclui-se no Sítio Peniche/Óbidos que fez parte da Proposta Preliminar da Lista Nacional de Sítios (LNS) ao abrigo da Directiva Habitats (que classifica as lagunas costeiras como Habitats Prioritários), apesar de não ter sido englobado na 1ª e 2ª fases da LNS, que foram publicadas pelas Resoluções do Conselho de Ministros nº 142/97 de 28 de Agosto e nº 76/2000 de 5 de Julho, respectivamente. Esta Lagoa enquadra-se na Lista de Zonas Húmidas elaborada de acordo com a Classificação de Ramsar numa extensão de 800 ha incluída na anterior. Os valores faunísticos relevantes para a sua classificação são 8 espécies constantes do Anexo I da Directiva Aves, 4 espécies de ocorrência ocasional e 1 espécie de mamíferos. Não se encontra enquadrada em nenhum dos outros sistemas de protecção ambiental internacionais da biodiversidade.

A análise dos Planos Directores Municipais de Óbidos e de Caldas da Rainha (PDM’s) e do Plano de Ordenamento da Orla Costeira entre Alcobaça e Mafra (POOC), permite verificar uma clara desarticulação entre os dois municípios e entre estes (particularmente o de Caldas da Rainha) e o POOC, no que se refere à gestão e ordenamento da Lagoa de Óbidos, particularmente no que diz respeito à falta de regimes de protecção que vão para além do previsto no POOC e sigam o espírito de protecção nele previsto. Mesmo o POOC, prevê a existência de demasiadas infra-estruturas de apoio na praia da Foz do Arelho e estas determinam uma pressão humana demasiado grande para uma zona tão sensível, tanto devido à Lagoa de Óbidos como às falésias existentes na praia e Vila da Foz do Arelho, que estão consideradas como áreas sensíveis a proteger.
Fora da área do POOC teria sido essencial que os PDM’s previssem regimes de protecção para todas as cabeceiras drenantes para a Lagoa e tivessem sido contempladas, soluções que previssem a instalação de zonas industriais fora das mesma zona drenante, o que não acontece no PDM de Caldas da Rainha. Embora o PDM desta cidade, preveja uma urgente implementação de um sistema de recolha e tratamento de efluentes domésticos e industriais, o mesmo está longe de ser eficaz, fazendo apenas tratamento primário e drenando para a Lagoa de Óbidos. Este PDM não desobedece ao POOC mas também não avança muito para além dele, notando-se ainda uma clara opção de desenvolvimento económico centrado nas actividades turística, urbanística, agrícola e industrial sem grandes preocupações de ordem de conservação da natureza. Embora seja feita referência por mais de uma vez à necessidade de protecção da Lagoa de Óbidos, esta inclui apenas a sua envolvente mais próxima, descurando o resto da bacia de drenagem. Quanto ao PDM do Concelho de Óbidos, este encontra-se neste momento em revisão e apenas existe para consulta o Plano executado em 1995, mas podemos constatar sem muito esforço que não há concertação entre as duas Câmaras, tanto no que se refere à gestão da Lagoa em si como por exemplo no que se refere à zona de drenagem para o Rio da Cal; o assoreamento de origem fluvial será certamente potenciado pela barragem em construção no Rio Arnóia, que determinará uma perda de capacidade de carga das águas do mesmo; as medidas de abertura ao mar levadas a cabo pelo INAG, tiveram entretanto alguns resultados inesperados e levaram à instabilização das zonas arenosas junto ao Bom Sucesso, com erosão junto a edificações e risco de ruína para algumas construções; o aterro entretanto construído pela Resioste drena com frequência lexiviados não tratados para o Rio Arnóia; o empreendimento turístico com campos de golfe previsto para a Poça das Ferrarias não prevê qualquer forma de minimização de impactos nem beneficiou de um estudo de impacto ambiental prévio; a última avaliação feita pela Empresa Águas do Oeste indica um elevado potencial poluente para a Lagoa de Óbidos, proveniente de suiniculturas, sendo estas essencialmente do Concelho de Óbidos; não foi criado qualquer refúgio ornitológico como previsto e, em vez disso desenharam-se dois percursos pedestres ao longo das margens da lagoa, com pontos de observação ornitológica que talvez não tenham sido muito bem escolhidos e que poderão vir a interferir com a avifauna nela ainda existente.

Conclusões

Se a Lagoa de Óbidos, de acordo com o Instituto da Conservação da Natureza, não merece ainda a classificação de Zona Especial de Conservação ou Zona Húmida de Importância Internacional, para só mencionar estes dois estatutos de conservação, o estado de degradação física em que se encontra e que tende a acelerar-se, aponta em sentido contrário e indica claramente que é absolutamente urgente encontrar uma forma de gestão para este espaço. Esta deverá não passar pela protecção integral com proibição de todas as actividades, mas delinear uma gestão sustentável que permita salvaguardar o habitat e espécies que o integram e, reintroduzir espécies locais desaparecidas nos últimos anos, apontando para uma utilização racional que mantenha os valores culturais, económicos e sociais que fazem desta Lagoa não só um espaço natural a preservar, mas também um local em que a actividade turística de qualidade e a pesca controlada, constituem um dos factores económico-sociais a preservar. Não se pode esquecer a existência desta Lagoa e urge encontrar uma forma de gestão sustentável para a mesma, que evite a sua degradação, recupere o ecossistema natural o melhor possível e, permita que as gerações futuras continuem a poder desfrutar dos seus encantos. Se não forem tomadas medidas de conservação consistentes, esta Lagoa tenderá a degradar-se cada vez mais até um ponto em que talvez já não seja possível a sua recuperação ou, no caso de ser ainda possível, será certamente mais onerosa e difícil. Será que devemos esperar por esse estado de coisas, ou iniciar já os procedimentos necessários à sua protecção e evitar custos desnecessários no futuro?

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